setembro 01, 2003

The Lurker e os Taxistas (ou mobilis gratia argumentandi )

Uma coisas interessante para se fazer quando se coloca o pé fora de sua própria cidade é conversar com o pessoal que vai se encarregar de seu transporte, especificamente aquele ser antenado, que já foi conhecido pelo pomposo nome de "Chaufeur de praça". Sinesíforos profissionais, sociólogos das horas vagas, professores da escola da vida, políticos de tempo integral, sempre dão uma boa idéia do que está acontecendo aonde se chega e sua visão particular representa, freqüentemente, a de uma classe.

É possível encontrá-los de todos os tipos: o profissional cioso, o politizado, o revolucionário trotskista, o bicho-grilo-reformado, o pai de família, o solícito (estes querem lhe oferecer um serviço a mais - indicando a "boa da noite" ou alguma coisa que o valha), entre muitas outras "qualidades". Síntese das percepções da população de uma área, os taxistas são um termômetro de uma sociedade. Trata-se de um grupo policultural, etnicamente diverso e multifacetado em que, invariavelmente, se encontra uma miríade de regionalidades, sotaques, concepções, estilos de vida. Diz-se, por exemplo, que Nova Iorque tem quase tantos condutores siks quanto Nova Déli. Imigrou, não tem uma formação compatível com outra atividade? Não arrnja outro emprego? Sempre se pode recorrer ao bom e velho serviço de motorista de aluguel. Não se assuste se tiver que esclarecê-lo que o SOHO é para baixo da ilha e não tem nada ver com o East Side. E o inglês deles será interessantíssimo, posso assegurar... que você não entenderá nada além da segunda palavra.

Em todos os países que visitei, este grupo se mostrou bastante atencioso, levando sua profissão a sério o mais das vezes. Contudo, sempre existem os espertinhos que dão mau nome à categoria: em Paris um chinês resolveu me "levar para passear" e tentou dar uma volta, imensa e desnecessária, passando dando a volta na Place de la Concorde para ir ao Louvre. Neste ponto concordo com um dos personagens de Matrix que disse que "a língua francesa é ótima para insultos", principalmente quando se tem que dar a entender que se sabe, e muito bem por sinal, qual o caminho que deve ser feito. Friso, contudo, ser esta a única ressalva que faço ao "Taxi Parisien", que tem em sua folha serviços nobres à pátria, transportando soldados para o front de batalha na primeira guerra mundial. Em linhas gerais são mais atenciosos do que os espanhóis por exemplo, até mesmo por conta de uma espécie de estatuto que eles têm. Em minha viagem mais recente, na qual precisei arranjar uma "chaise roulant" para melhor locomover minha mãe, foram extremamente solícitos para acomodar a cadeira de rodas no porta-malas ? e atente para que não é qualquer "citroën quatre chevaux" que comporta este adereço.

Os taxistas portugueses são, como seus colegas cariocas, animados e bem falantes. Entusiasmam-se quando sabem que você é brasileiro e querem sempre saber o que está se passando "na terrinha, ora pois". De maneira semelhante aos demais patrícios, têm o raciocínio muito curto para humor e sarcasmo. Sabe aquela história de que português é burro? Não é ignorância: é ingenuidade. Evite as piadas que rimem com o "não pagamento" da féria eles simplesmente não entendem - levam tudo ao pé da letra.

Por seu turno, os profissionais na Itália são positivamente insanos. Asterix já dizia, com propriedade: "Ils sont fous, ces romains", o que, traduzido para o italiano fica mais divertido ainda - "Sonno Pazzi Questi Romani. Nada mais verdadeiro quanto ao tráfego de Roma. O condutor xinga, gesticula, pára o carro, bota meio corpo para fora da janela para discutir com seu "contraparte". E depois se compraz em esclarecer seus motivos e razões, das quais se encontra cheio. Estacionam onde querem, quando querem e acham ruim que qualquer outro faça o mesmo. Mas são muito bem instruídos quanto aos meandros da Cidade Eterna.

The Lurker Says "A man travels the world over in search of what he needs and returns home to find it." George Moore